Autonomia das trabalhadoras informais ainda é conquistada na extenuante rotina doméstica

mulheres1Pesquisa sobre trabalho e independência econômica das mulheres mostra que mistura de ambientes para as tarefas produtivas e reprodutivas resulta em uma espécie de confinamento.

A situação das trabalhadoras autônomas de Toritama – cidade do Agreste de Pernambuco inserida no segundo maior polo têxtil do país – foi um dos alvos da pesquisa qualitativa Desenvolvimento, Trabalho e Autonomia Econômica na perspectiva das mulheres brasileiras, apresentada na semana passada, no Seminário Autonomia Econômica das Mulheres, Trabalho e Desenvolvimento: Reflexão e Críticas Feministas, organizado pelo SOS Corpo, no Recife. Além da cidade pernambucana, Barcarena, no Pará, e a Região Metropolitana de São Paulo também foram objetos do estudo, que avaliou a independência econômica das mulheres inseridas em trabalhos precários.

A pesquisa parte do entendimento da autonomia das mulheres como principal causa do feminismo. E a partir do reconhecimento da importância dessa autonomia econômica como instrumento de ruptura com relações de dependência, o estudo ressalta a independência financeira como parte fundamental da construção da possibilidade de uma vida com maior liberdade e capacidade de decisão sobre sua própria vida.

“Numa sociedade patriarcal, machista, em que a mulher é tolhida de diversas maneiras e onde a questão da violência é tão presente, a autonomia financeira é relevante, é fundamental”, defende uma das coordenadoras do SOS Corpo e pesquisadora envolvida no projeto, Verônica Ferreira.

A pesquisa revelou que, em Toritama, a maioria das mulheres trabalhadoras informais do setor têxtil produzem dentro de suas próprias casas. A mistura desses ambientes implica numa administração confusa do espaço, do tempo e das tarefas produtivas e reprodutivas. “É uma espécie de confinamento em casa”, explica a coordenadora da pesquisa e membro do SOS Corpo, Maria Betânia Ávila.

Diante do cenário, a pesquisa classificou como intenso, extenso e intermitente o trabalho realizado pelas mulheres. “Muitas comem na máquina de costura, por exemplo. Muitas têm problemas de saúde, de circulação, coluna, porque estão sempre sentadas”, aponta a pesquisadora.

A falta de espaços de lazer foi apontada excepcionalmente pelas pernambucanas que participaram da pesquisa. Apesar da peculiaridade da queixa, no entanto, nas três cidades estudadas as mulheres têm pouco tempo para o lazer e até mesmo para cuidar de si, já que os dias são todos comprometidos pela rotina. “Em São Paulo, tem mulheres que só tinham 1h30 livre no dia”, comenta Ávila.

Para Verônica Ferreira, a falta de tempo é um fato que compromete a autonomia feminina. “Autonomia não significa simplesmente ter a renda, mas também a inserção num trabalho com garantia de direitos e tempo para viver uma vida não só tomada pelo trabalho. Sem tempo livre não existe liberdade”, pontua.

mulher2A partir da desconstrução da ideia de dupla jornada, o estudo considera que, na verdade, tratam-se de jornadas simultâneas, uma vez que cotidianamente as demandas do trabalho e dos cuidados com os filhos e com a casa se atravessam. A ausência do companheiro na divisão das tarefas domésticas esteve presente em todas as cidades pesquisadas. “Os homens aparecem pouco. Porque não estão ou porque quando estão não fazem ou fazem pouco”, afirma a pesquisadora.

“Essas mulheres precisam compartilhar as tarefas domésticas com a família, mas o estado também precisa assumir sua responsabilidade com a questão da política pública, da política social, com escola em tempo integral, política de creche. São elementos fundamentais para garantir essa autonomia”, frisa Ferreira.

Outra questão problematizada pela pesquisa é uma espécie de acumulação do trabalho, onde as mulheres que, dentro da atividade respondem a um intermediário que responde a um empresário, contratam sua própria mão de obra.

A coordenadora da pesquisa destaca o que chama de fio comum entre as diferentes realidades estudadas, nas quais é observada uma precariedade nas relações e nas condições de trabalho. “Ter os filhos na escola é uma prioridade para elas. Há uma sincronicidade mesmo em diferentes cenários”, aponta Maria Betânia Ávila que também observa um sentimento de conquista, apesar das dificuldades. “A questão da independência financeira é bem forte, elas acreditam que conquistaram algo na vida, outro patamar.”

Estudos paralelos

No mesmo período em que a pesquisa foi concebida também foram elaborados outros três estudos sobre políticas públicas, cujas construções permeiam questões da própria pesquisa qualitativa. Os resultados também foram apresentados na semana passada, no Seminário do SOS Corpo.

“Queríamos tanto a análise sobre a inserção dessas mulheres quanto uma análise das políticas públicas que, em princípio, estão mais diretamente relacionadas às trabalhadoras e seus cotidianos de trabalho”, explica Maria Betânia Ávila.

Os estudos Mudanças e permanências das práticas sociais de cuidado, que analisa como os programas Pró-infância e Brasil Carinhoso colaboraram para a discussão sobre igualdade de gênero no país; Qualificação das Mulheres para a Construção Civil, que analisa as questões do setor na Região Metropolitana de São Paulo; e o Mei e as Mulheres, que avalia o impacto da implantação do cadastro de Micro Empreendedor Individual (MEI) na vida das mulheres podem ser baixado no site do SOS Corpo

Por DP

Desastre no RS acende debate sobre fim de RÁDIO AM

Desfile inclusivo foi o destaque na abertura do Festival do Jeans de Toritama 2024

22ª Edição do Festival do Jeans 2024 é sucesso em Toritama

×